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Número 21


Apresentação da Mealibra

A azáfama que nos preenche o dia-a-dia só raramente nos permite distinguir aquilo que é essencial do que é acessório, preocupados que estamos com as questões a que temos de dar resposta, já que não ironicamente cada vez mais nos pedem coisas para a véspera. E assim nos deixamos levar pela corrente dos dias, como peças de um puzzle cujas regras não dominamos.

Vem isto a propósito de um acontecimento que poderia ter passado despercebido se não existisse em Viana do Castelo uma instituição com poucos recursos, é certo, mas com um projecto de intervenção consequente: o Centro Cultural do Alto Minho. Foi assim que no passado dia 26 de Janeiro se reuniu no CAFÉ-TEATRO um grupo de pessoas interessadas pelas questões suscitadas pelos novos livros e pelo mais recente número da MEALIBRA.

Sendo uma referência incontornável no mundo das revistas culturais publicadas no nosso país, a qualidade intrínseca dos textos que a MEALIBRA tem publicado não pode deixar de ser associada à autoridade dos colaboradores que nela participam. A pergunta que se coloca é, inevitavelmente: como é possível, numa cidade com uma débil actividade de pesquisa, de debate de ideias e de criação existir e manter-se uma publicação com estas duas características?

A resposta é porém muito simples: a MEALIBRA tem um Director e um Projecto. Dir-se-ia que há redundância na resposta já que forma e conteúdo se associam: a  direcção é definida pelo próprio projecto cuja realização se antecipa. 

Neste número agora apresentado, o Dr. Fernando Canedo consegue reunir dois dossiês com quase cinco dezenas de páginas cada: um sobre David Mourão-Ferreira, porque "pobre seria a vida se a vivêssemos só com os vivos", inclui o poema inédito  "Celebração da Poesia" e diversos ensaios magníficos sobre a sua obra; outro, de semelhante extensão e qualidade, constitui uma homenagem muito oportuna a Agustina Bessa-Luís, celebrada com pela palavra e pela pintura.

Num primeiro momento o leitor poderá suspeitar da relação não só entre os dois assuntos como entre os textos provenientes de autores tão diferentes como: Mário Cláudio, Isabel Pires de Lima, José Saramago, Maria Alzira Seixo, Carlos Reis, Álvaro Manuel Machado, Gonçalo M. Tavares, Fernando Pinto do Amaral, António Manuel Couto Viana, Eugénio Lsiboa, Teresa Rita Lopes, Francisco Simões, Teresa Martins Marques, só para citar autores de referência inquestionável. Mas essa dúvida logo se dissipa quando começa a cruzar os textos, a encontrar complementaridades, a descobrir o poder da palavra em diálogo também com as imagens e os desenhos que acompanham o verbo (ver, entre outros, Júlio Resende, José Rodrigues, Armando Alves, Arnaldo, Albuquerque Mendes).

Mas a mais recente MEALIBRA tem, como já nos habituou, a participação de outros autores de diversos géneros textuais numa terceira parte. Muito haveria a dizer sobre o conteúdo desta revista mas é difícil fazê-lo aqui, por falta de espaço mas também para não faltar ao respeito que nos merece o leitor impedindo-o de sentir que os textos foram escritos para si. Além do mais, o colóquio/tertúlia debruçou-se ainda sobre três, sim, três novos livros de um colaborador assíduo - Miguel Real que assina um quinto ensaio sobre Pensadores ligados a Viana do Castelo, desta vez sobre Guerra Junqueiro.

A presença de Miguel Real no colóquio foi em tudo reveladora: de cultura, de sabedoria, de histórias "suas e de outros", dos seus livros, da sua visão de Portugal. No livro "O último minuto na vida de S.", editado pela QuidNovi em finais de 2007, o romancista Miguel Real transformou em 


mito a relação de Francisco Sá- Carneiro com Snu Abecassis, "o último grande amor português" só comparável ao de Pedro e Inês. Num outro registo, em "A morte de Portugal" (Campo das Letras, 2007) o ensaísta Miguel Real envereda pelos caminhos da nossa cultura tecendo os complexos que nos foram definindo como nação com 800 anos de História.

Com este livro o autor dá continuidade a uma linha de pesquisa (cf. a sua obra premiada "Portugal: Ser e Representação", Difel, 1998) que assenta nos contributos do Padre António Vieira (esse luso-brasileiro "autêntico cidadão do mundo, precursor dos Direitos Humanos ao revoltar-se contra a prioridade dos interesses políticos e económicos sobre indígenas primitivos e indefesos e contra a escravatura concebeu há quatro séculos (!) uma cidadania global" cuja figura e obra se espera venha a receber o devido relevo neste ano de 2008, na passagem dos 400 anos do seu nascimento), Fernando Pessoa, Agostinho da Silva. Trata-se de um livro polémico e que nos obriga a (re)pensar Portugal no tempo em que as identidades são postas em causa. 

A magnífica obra "O mar como destino" (Campo das Letras, 2008), editada pelo Grupo Desportivo e Cultural dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo foi apresentada pelo responsável de edição Gonçalo Fagundes e pelo próprio Miguel Real, autor do texto. Atrevemo-nos a dizer, sem correr o risco do exagero, que se cumpriu nessa noite a tríade:  Portugal "Amor" Mar.

Doutor Benjamim Moreira